segunda-feira, 17 de maio de 2010

Crianças Invisíveis

João e Bilu; eles têm um pouco da cara dessa cidade, desse Brasil.

Por Sabrina Fantoni

Crianças invisíveis é um filme do aclamado cineasta Spike Lee e mais 7 diretores, dentre eles a diretora e produtora Kátia Lund -cujo principal trabalho foi em Cidade de Deus, filme de Fernando Meirelles.

Considero-me suspeita pra falar sobre esse filme que me foi apresentado em 2006, numa aula de sociologia quando eu estava no segundo colegial. Dentre várias histórias, de alguns países como Estados Unidos e Itália, a do Brasil, do João e Bilu, é sensacional; é de uma verdade e sensibilidade irrefutável, além da fotografia magnífica e de todo conteúdo social ideológico por trás mostrado de uma maneira cativante e acolhedora. Ora alegre, ora desconfortável. O intuito é realmente incomodar, fazer pensar e analisar a discrepância cultural e econômica presente nessa cidade, na qual, analogamente, foram criadas fronteiras imaginárias e impostas, sobretudo como na África colonizada, entretanto aqui elas ergueram-se verticalmente, não só cultural e socialmente como fisicamente. A principal imagem de "João e Bilu" é a fotografia dos edifícios luxuosos localizados na Marginal Pinheiros cujos tem como paisagens favelas que estão a alguns metros de distância.
A simplicidade e bondade marcada na personalidade dos protagonistas contagiam até mesmo a pessoa mais cética e alheia. Dois meninos espertos, determinados, lutadores e sempre com um sorriso no rosto, com uma carta na manga. Aquela peculiaridade bem brasileira, que rebate a ideia de que brasileiro é acomodado e preguiçoso; pelo contrário! João e Bilu são o retrato do típico brasileiro que vai a labuta, logo de manhã e volta pra casa só no fim do dia exausto mas com a sensação de dever cumprido. Pra mim, brasileiro acomodado é aquele que reproduz os discursos manjados e padronizados, que mal sabe da história de seu povo e seu país e prefere se conformar com a lavagem cerebral imbuída e calcada nos nossos pré-conceitos ufanistas e edenistas, baseado também na educação familiar e nas relações sociais.
Fato é que poucos brasileiros regozijam-se da abundância cultural de sua pátria; há uma relação de amor e ódio, de pertencimento e não pertencimento, de identificação e não identificação com as características desse país. Mas posso lhes adiantar que João e Bilu faz com que nos apaixonemos um pouco mais pela cara desse Brasil tão misturado, heterogêneo e também desfigurado.
Dói. Dói de verdade quando vejo que algum brasileiro odeia o Brasil, me ofendo. É por esse motivo que não esqueço nunca das aulas de Cultura Brasileira do segundo semestre que aprendemos tanto sobre nossas raízes, sobre Sérgio Buarque de Holanda, Florestan Fernandes e Gilberto Freyre; Chicos, Marias, Joãos e Josés.
Meu Brasil presente nas massas e maçãs de Almir Sater; no velho e invisível Avohai de Zé Ramalho; no amor malfeito depressa de Chico Buarque; a Juliana do joão e do josé de Gilberto Gil; no sonho e no pó, no destino de um só de Renato Teixeira...

A beleza se faz presente nos discuros proferidos, nas palavras escritas; a beleza que não é vista em gente como João e Bilu, que não é cantada, mas contada e mostrada da maneira mais verdadeira e simples. Gente invisível que está tão presente no nosso dia-a-dia e que passa despercebida; só conseguimos enxergar a beleza se assim nos é encaminhado e apontado pelo olhar do outro. Crianças invisíveis é um filme que grita a beleza e a pureza em meio a sujeira e a podridão. Quase como uma flor de lótus com suas pétalas auto-limpantes, as crianças ao redor do mundo mesmo com medo, dor e insegurança, transmitem o dom da vida frente ao caos.

5 comentários:

  1. "... lavagem cerebral imbuída e calcada nos nossos pré-conceitos ufanistas e edenistas, baseado também na educação familiar e nas relações sociais."

    E a produção midiática fica aonde nessa história?
    Boa parte dessa "lavagem cerebral" vem de um sistema que defende e reproduz a ideologia meritocrática de competição. Sistema esse que reforça a lógica econômica da qual o João e o Bilu sabem bem que estão a margem.

    Só pra não perder o costume e ser chata com vc, como só uma futura ciêntista social pode ser com uma futura jornalista.

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  2. Re, mas a lavagem cerebral e os pré-conceitos vem da onde? achei q tivesse ficado implícito, por isso coloquei depois "baseado também na educação familiar e nas relações sociais" pq antes disso, quem media as relações é a mídia.
    Mas obrigada, linda!
    críticas sempre construtivas.

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  3. Huum... é, pra mim a "lavagem cerebral" vem mesmo de certos valores sociais (patriarcalismo e personlismo) que ainda persistem no Brasil e se desdobram nessa ignorância política que não escapa nenhuma classe social, mas que creio que seja mais forte na classe média. Pra mim a mídia entra nessa perpetuação e reforço da ignorância.

    Sei lá, é uma relação tão intrinseca que fica dificil falar onde começa a desinformação do povo e onde a midia é culpada por isso. Dá até pra fazer uma boa pesquisa sobre isso, já que, uma reproduz a lógica falida do outro.

    Eu vejo que nós precisamos de jornalismo de emancipação e de qualidade nesse país pra sair desse circulo vicioso de manipulação de informação. Nesse sentido deposito minhas esperanças em vcs que estão entrando nesse mundo novo junto comigo. Sou chata e pego no pé pq quero o mesmo: um País Critico e Informado.

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  4. Ps: Já to seguindo esse blog e como vc e a Vana falaram... A Caroline Albanesi é gatona mesmo! Hahahaha.

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  5. Compartilho da mesma opinião que você; me ofendo com as pessoas que falam baboseiras do Brasil. Nosso país é único, tem seus lados ruins, como qualquer outro, mas lados positivos que só existem aqui. Enfim, não quero fazer um discurso nacionalista aqui, haha.
    Vou assistir ao filme, fiquei curioso.
    Beijos, belo blog.

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