segunda-feira, 19 de abril de 2010

Animal, empático, como a gente.

Por Sabrina Fantoni


Frans de Wall estudou biologia na Holanda, seu país de origem; é considerado um dos mais importantes primatólogos do mundo e já escreveu mais de 6 livros para o público leigo. Neste vídeo ele fala sobre neodarwinismo, sociedade capitalista e a empatia presente nas relações animal-humana

Estou terminando de ler um livro, que nos foi indicado pelo nosso querido e estimado professor de comunicação e cultura, Fernando Salinas, logo no início do curso: Eu, primata - porque somos o que somos, do primatólogo Frans de Waal lançado em 2005.
Inicío esse post com o vídeo do autor falando sobre o assunto que quero tratar aqui: Empatia.
O conceito desse termo basicamente é: sentir como se fosse o outro; entender e se propor a sentir aquilo que o outro possa estar sentindo em determinada situação. A empatia começou a ser estudada recentemente pela ciência, pois antes consideravam-na algo relacionado à misticismo ou espiritualidade; hoje entende-se como uma das características evidentes da nossa condição humana.
Devo reiterar que é explícita não só nas relações humanas -embora na nossa espécie seja mais desenvolvida, desde os primeiros anos de vida- mas também nos animais, principalmente mamíferos. O principal pensamento que tirei dessa obra é do porque assimilamos a brutalidade humana com a selvageria animal. E quando algum animal -geralmente cães, macacos- pratica um ato "heróico" é reverenciado como humano, e tratado como algo inacreditável um ser irracional ser solidário e se prontificar para ajudar alguém da mesma espécie ou nao. Casos assim são quase que frequentes na mídia, como se fossem excepcionais e de grande relevância, como o do cachorro que pulou na frente de uma cobra quando percebeu que essa iria atacar seu dono -um menino ainda criança- e recebeu, assim, o veneno no lugar dele.
Penso que devem, sim, ser noticiados casos assim, entretanto, não tratados como algo inédito, pois essa solidariedade e ímpeto não se restringem somente aos humanos.
Foi construída uma estética de pensamento, classifico eu, de maniqueísta; o belo e o feio, o certo e o errado, o humano e o animal. A violência, brutalidade, competição e a insanidade nos é inerente, no entanto atribui-se todas essas características aos animais irracionais; ao passo que também é inerente a nós a generosidade, a empatia, a bondade e a resignação, essas também presentes e inerentes aos animais embora nunca lhes darmos esse crédito.
Frans de Waal destaca que não só somos tão selvagens e cruéis quanto os animais, como podemos ser mais brutais do que eles. Porém, também podemos ser muito mais bondosos, gerenosos e empáticos.
Amo os animais; vivo falando que não gosto de gente mas me contradigo nesse ponto o tempo todo. Certa vez, eu e Vanessa Yazbek fomos comprar roupas, entramos numa loja e saímos sem levar nada. O vendedor foi muito educado, sem aquela afobação de querer vender, havia apenas uma simples boa vontade de atender bem à um cliente, tanto que quando fomos embora ele deu um sorriso verdadeiro e nos chamou de "meus amores" logo que o agradecemos pela atenção. Saímos de lá nos olhando com um ar de satisfação que nao conseguimos não comentar sobre o ocorrido até que soltamos um "Ah, fofo..." na mesma hora.
Houve também um fato que aconteceu comigo, inesquecível. Estava eu no ponto de ônibus indo para o Mackenzie quando fui abordada por uma velhinha de 84 anos; ela aproximou-se e falou: "Oi, meu anjo lindo de vermelho e branco" e começou a me contar de sua vida, de situações fortuitas e pediu pra eu nunca desanimar seja lá por qual motivo fosse. Ela sabia que eu estava aguardando meu ônibus e quando eu olhava para o lado para verificar se ele já estava chegando, ela mesma se prontificava para me avisar assim que avistasse o Praça Ramos. Não me esqueço da doçura presente em seu olhar e na simples vontade de expressar o que sentia naquele dia, distribuindo sorrisos pra quem quer que passasse ou parasse no ponto. Todos a observavam com carinho, como se fosse uma criança linda. Aquilo simplesmente fez o meu dia, pois pude ouvir alguém que simplesmente queria me contar algo, além de toda simplicidade e generosidade que absorvi daquela pequena senhorinha. Creio que esse foi o ápice da empatia que já vivi nesses 20 anos de idade.
Fato é que muita gente não teria dado atenção para a velhinha ou ficaria ouvindo-a de má vontade; ás vezes até eu poderia estar num dia terrível, nada disposta para conversas fortuitas num ponto de ônibus, mas ela simplesmente me ganhou, e olha que eu nem sou tão bem humorada assim.
Tem um trecho do grande clássico de George Orwell - 1984, que para mim, é o exemplo cru de empatia; não de humano para humano, mas sim de humano para com a natureza, uma força maior, àquilo em que acreditamos e que nos move:
“... -Os homens são infinitamente maleáveis [...] são inermes, como os animais. A humanidade é o partido.
-Não me importa. No fim haverão de vos derrotar. Mais cedo ou mais tarde verão o que sois, e então vos estraçalharão.
-Vês algum sinal de que isso aconteça? Alguma razão para que aconteça?
-Não. É o que acredito. Sei que falhareis. Há algo no universo... não sei o quê, um espírito, um princípio, que nunca podereis vencer.
-Acreditas em Deus, Winston?
-Não.
-Então o que é esse princípio que nos derrotará?
-Não sei. O espírito do Homem.
-E tu te consideras homem?
-Sim."
Talvez o vocalista da banda Nirvana, que se suicidou em 94, Kurt Cobain tenha cometido tal ato pela apatia e falta de perspectiva em si enquanto homem, ou também, enquanto homem e sociedade. Pode ser que pela ausência de empatia que em sua carta de despedida ele escreveu essa palavra muitas vezes no final de seu texto...
Empatia, empatia, empatia...
Assim como a criança de 2 aninhos que chora ao ver o amiguinho chorar; assim como o cão que se prontifica a lamber as lágrimas de seu dono, assim como um gorila que fica transtornado -mesmo em sua condição de selvagem- ao perceber que feriu alguém de sua espécie, ou nao; Assim como eu fico desesperada ao ver minha mãe inquieta por não saber onde meu irmão se enfiou; ou aquela sua amiga que está sofrendo por amor e você se pudesse faria de tudo para aliviar a sua dor.
Por fim, a empatia consolida nosso estado de ser humano-animal, e consolida o estado do animal-ser humano.

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